Quando um livro de Julio Verne caiu em minhas mãos, lá pelos meus onze anos de idade, a surpresa da descoberta de um novo mundo me encantou. Dar volta ao Globo ou me esmerar pelas profundezas do Oceano pareciam realidades maravilhosas e completamente impossíveis. Tão distantes quanto uma viagem à Lua.
A primeira vez que me encontrei sozinha em outro país, havia sido praticamente ejetada de uma nave. Minha família jamais foi das que viajavam nas férias, íamos apenas ao interior do Paraná quando muito. Então, para mim, a Europa, para onde havia sido enviada a trabalho, era tão distante quanto uma viagem ao centro da Terra.
Dois anos depois, começo a esticar as asas para outros voos. Cada vez que piso fora de casa, levo comigo as inspirações de outras mulheres que conheci em momentos diversos. Me inspiraram, com sua coragem independente e aventureira, a imaginar para além do meu pedaço de petit pavê. Todos que encontramos, são professores, se assim nos permitirmos.
Viajo sozinha com o meu coração. Não ando perdida, mas desencontrada. Levo o meu rumo na minha mão. Cecília Meireles
Aos dezesseis anos, conheci uma delas. Estava em meu primeiro emprego formal, num colégio particular pomposo. Atendia telefones, marcava reuniões, indicava direções pelos corredores. Nada especialmente intelectual ou criativo. Algo que me deixava inquieta, ansiosa. Me lembro de em meio de uma das minhas muitas reclamações, Juliana me olhar nos olhos e perguntar: então por que você trabalha aqui?
Juliana no Cambodia
Não me ocorria no momento que sempre temos alguma escolha, por mais difícil que ela seja. Ainda por vezes me esqueço disso. Mas com os olhos vivos e a figura vibrante, me vem a pergunta de Juliana. Eu sabia de ouvir falar sobre o quanto ela havia viajado. Para mim, parecia exótica a ideia. Morar sozinha em outro país, se perder por onde não se conhece a língua, se soltar do que nos traz conforto.
São todas as mulheres que nos levam ao mundo
México, Peru, Colômbia, Chile… Meses frios morando nos Estados Unidos, uma mudança para Portugal, estar sozinha pela Ásia. Juliana Stock se aventurou das tantas formas que lhe surgiram pela frente.
Ju ganhou repertório nas diferentes vivências com a família, amigas e outras galeras. “Sempre tive respaldo de uma irmã viajante e pais que gostaram da fruta”, conta. Assim aprendeu a sempre estar atenta, fazendo amigos por onde passava. Como eu vejo, quando estamos sozinhos, estamos com todo mundo.
Embora ser mulher nos traga um medo inerente ao gênero, a ousadia de se meter onde dizem que não devemos nos traz a liberdade. “Tenho figuras femininas fortes perto de mim, não tenho dúvida que esse é o maior incentivo para ser uma mulher com vontade de viver!”, diz Ju.
Um planeta, muitas jornadas. Tanta gente, tantas fachadas. Lutas e passeatas. Pessoas, bichos, prédios. Progressos? Florestas, campos, jardins. Pastos? Capitalismo, comunismo, anarquismo. Democracia, hipocrisia, utopia. Jesus, Krishina, Tupam. O poder, o verbo, o adjetivo. Humildade, bondade, sincronicidade. Sentir, só sentir. Poesia, sabedoria, fantasia. Os outros, os egos. Radical, banal, racial. De dentro, de fora. Eu, tu, eles. Todos. Olhar. Perceber. Tentar. Ser. Um. _JuStock
A Série Viajante Sola
Numa noite nas ruas portenhas, uma senhora arregalou os olhos quando a respondi que estava ali sola. Com sorriso aconchegante ela respondeu: muy valiente! A frase dela se tornou uma tatuagem no meu braço direito, acompanhada de um avião, para me lembrar de esquecer os medos e ir mesmo.
Sola e Valiente!
Além dessa senhorinha argentina, tem tantas outras histórias… Valentina Tereshkova, a primeira mulher a ir ao espaço. Amelia Earhart que pilotou sob o Oceano Atlântico antes de qualquer outro. Bertha Benz, que inaugurou as viagens de carro na história. Sua prima ou tia que largaram tudo para redescobrir o mundo.
Da vontade de registrar essas empreitadas e inspirar outras a fazerem o mesmo, começo a série de reportagens. Aperte o cinto e vamos juntas!
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