Fotos do Gabriel Castro
21, 22, 23… Alice começou a contar as vigas do teto. Tinha o costume em momentos de extremo tédio. Sua companhia já estava adormecida ao lado. Foram dias de conversa até finalmente organizarem os horários para o encontro, o café era legal, a conversa foi daquelas de elevador.
Quando finalmente chegaram ao que interessa, bem, durou pouco. Durou nada. Para ele, dormindo, parecia ter sido bom. Afinal o sono são dos que se acham justos. Mas Alice… Ah, Alice! Quantas vezes já tinha perdido o sono com a decepção do orgasmo não vindo? Suspirou profundamente:
-Eu não me depilei pra isso.
Esse tipo de frase, tão drasticamente sincera, fica quase sempre reservada às nossas exasperações mentais. É como reclamar do chefe quando ainda se precisa do emprego: até vale na mesa de bar, mas na hora do vamos ver… Lembramos da conta de cartão de crédito e respiramos fundo, deixando a decepção restrita ao pensamento.
Nossos pelos evoluíram junto da postura, quanto mais eretos ficamos, menos penugens. Ainda assim, às vezes nos parece muito. A insatisfação humana nos concedeu criações que vão da roda às giletes.
Na Idade Média a depilação era digna de fogueira.
-BRUXAS!
Gritavam camponeses às mulheres sem pelos pubianos.
Como se a menor inclinação feminina à sexualidade fosse em razão de mandinga. Pudera! Nosso orgasmo foi por décadas associado a histeria, e o ponto G – que seria responsável pelo prazer durante o ato sexual – é uma grande interrogação cientifica.
Talvez por isso tenhamos aberto o caminho. Na esperança de que sem distrações encaracoladas o lugar que realmente tem efeito fique à vista. Tal costume é histórico.
As egípcias usavam argila, sândalo e mel para retirar pelos. Já as gregas, no período antigo, desenvolveram um instrumento denominado estrigil, uma varinha de cerca de 30 cm com a ponta curva que arrancava tudo que encontrava no caminho.
No Brasil, as virilhas nuas das índias foram assunto na carta de Pero Vaz de Caminha. Concedemos às europeias e todas outras mulheres do mundo uma adaptação “a la brasileira”: depilação total – virilha e tudo que estiver por perto.
O século passado fez até nossos pelinhos seguirem tendências de moda. Com roupas mais curtas e justas, mais corpo ficou exposto, dando atenção às axilas e pernas, que antes ficavam peludas por baixo de camadas e camadas de tecido. Na luz do dia, passaram por ceras quentes.
As décadas de 1960 e 1970 pregavam a liberdade com o movimento hippie, que ia do fim às guerras ao crescimento desenfreado dos cabelos corporais. Hoje, alguns deles até ganham tingimento.
De toda forma, não acho que tenha adiantado. Clitóris a mostra ou encoberto, são poucos seus desbravadores. Enquanto nós, meninas, crescemos com pirulitos e picolés fálicos, não acredito que exista muito incentivo para que meninos aprendam a degustar cerejas.
Na vida adulta, poucos dos homens se atrevem a este feitio. Talvez por terem ouvido os rumores de nossas feitiçarias durante a Idade Média. Não é à toa que lésbicas tem comprovadamente mais orgasmos: habituadas a própria anatomia entendem os poderes que guardamos entre as coxas.
Quando a preparação estética não é correspondida à altura, resta fazer uma troca: seja de parceiro ou de gilete por liberdade. Entendeu, Alice?
A história da romã
Em diversas culturas e religiões a romã está ligada a fertilidade e desejo sexual feminino, por ser uma infrutescência leva o significado de nascimento, além de juventude quando nas mãos de Afrodite, deusa do amor e sexualidade.
Ainda na mitologia, Perséfone é condenada ao reino dos mortos com Hades, seu tio e deus do submundo, depois de comer três romãs. Lhe era proíbo ingerir qualquer alimento quando foi raptada por ele, quebrando as regras recebeu como castigo o dever de voltar durante três meses por ano para o inferno com Hades, agora seu amante.
As romãs aqui se tornam uma metáfora ao reconhecimento de que Perséfone não era mais uma donzela, mas havia despertado para seus desejos.
Por seu formato, e talvez pelo tingimento que liberam ao serem cortadas, as romãs são associadas a vulva na Ásia. Na Índia seu suco é tomado para assegurar fertilidade.
As fotos
Me uni aos queridos Gabriel Castro e Bruna Daniel em um domingo ensolarado para ilustrar a matéria. Com romãs que encontramos no Mercado Municipal de Curitiba, Bruna criou uma maquiagem celebrando suas cores. Gabriel fez os registros com luz natural, como é de seu costume, e cheio de sensibilidade.
Comments